No ano de 212 a.C., após um cerco de dois anos à cidade de Siracusa, na Magna Grécia, atual Sicília, esta foi capturada pelas legiões romanas. Quando a casa de Arquimedes – que com seus engenhos ópticos e mecânicos retardou ao máximo a queda da cidade – foi invadida pelos romanos, ele estava no quintal desenhando na areia suas figuras e estudos geométricos, quando um dos soldados pisou sobre os mesmos. Noli tangere circulos meos (não toque em meus desenhos), exclamou Arquimedes em seu precário latim, sendo imediatamente morto por uma lança, que destruiu fisicamente este velho filósofo e matemático. Mas não conseguiu eliminar o seu acervo intelectual, que, atravessando os séculos, chegou até nós.







Neste blog republicaremos também artigos da minha coluna semanal BRASILIANA, do jornal MONTBLÄAT editado por FRITZ UTZERI.




domingo, 7 de março de 2021

Pagu: a Trágica Musa do Modernismo

 

No dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, que tal relembrarmos desta mulher tão esquecida?

          Patrícia Galvão, a Pagu (1910-62), foi jornalista, escritora, poeta e agitadora cultural.  Foi também crítica literária, de teatro e artes visuais.  Traduziu obras de autores quase desconhecidos no Brasil, como Kafka, Valéry, Pirandello, Ionesco e outros. 

          Pagu foi militante comunista, tendo sido ferida em protestos de rua em Paris e torturada na prisão no Rio de Janeiro.

          Um fato interessante e original em sua vida, é que ela introduziu a soja em nosso país, trazendo sementes que lhe foram presenteadas pelo último imperador da China.

 

          Abaixo reproduzo a elegia feita por Carlos Drummond de Andrade por ocasião de sua morte:

 

Imagens de Pedra

Carlos Drummond de Andrade

Patrícia Galvão, musa trágica da Revolução, entre literatos... O qualificativo parece romântico. Mas se levarmos em conta que esta mulher de grande valor e sensibilidade entrou para o cárcere aos 25 anos de idade e dele saiu aos trinta, pagando alto preço pelo crime exclusivo de ter ideias de justiça social quando fascismo e nazismo pareciam na iminência de conquistar o mundo para sempre; se soubermos que viajou à Europa e à Ásia para confrontar a coisa imaginada com a coisa real, e esse confronto não a deixou feliz; que experimentou a condição proletária, e conheceu a impostura dos chefes e a miséria de estrutura do partido da revolução, sentiremos a gravidade do destino de Patrícia, a que não faltou o definitivo desencanto, prêmio rude de quem vive uma ideia-sentimento: sem se reconciliar com a ordem combatida recolheu-se ao “templo da decepção”, onde a arte e a literatura oferecem consolo ao ser ofendido.  Na história do modernismo, seu nome põe um colorido dramático de insatisfação levada à luta política. 

Correio da Manhã, 16 de janeiro de 1963.

 

Nas vésperas de sua morte, Pagu publicou o poema “Nothing”.

 

Nothing

 

Nada nada nada

 

Nada mais do que nada

 

Porque vocês querem que exista apenas o nada

 

Pois existe o só nada

 

Um para-brisa partido uma perna quebrada

 

O nada

 

Fisionomias massacradas

 

Tipoias em meus amigos

 

Portas arrombadas

 

Abertas para o nada

 

Um choro de criança

 

Uma lágrima de mulher à-toa

 

Que quer dizer nada

 

Um quarto meio escuro

 

Com um abajur quebrado

 

Meninas que dançavam

 

Que conversavam

 

Nada

 

Um copo de conhaque

 

Um teatro

 

Um precipício

 

Talvez o precipício queira dizer nada

 

Uma carteirinha de travel’s check

 

Uma partida for two nada

 

Trouxeram-me camélias brancas e vermelhas

 

Uma linda criança sorriu-me quando eu a abraçava

 

Um cão rosnava na minha estrada

 

Um papagaio falava coisas tão engraçadas

 

Pastorinhas entraram em meu caminho

 

Num samba morenamente cadenciado

 

Abri o meu abraço aos amigos de sempre

 

Poetas compareceram

 

Alguns escritores

 

Gente de teatro

 

Birutas no aeroporto

 

E nada.

 

“Nada mais do que nada

 

Porque vocês querem que exista apenas o nada

 

Pois existe o só nada!

 

(Publicado em “A Tribuna”, Santos/SP, em 23/09/1962).

 

Ler mais em: “Pagu: Vida-Obra”, Augusto de Campos, Companhia das Letras, 2014.

 


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