No
dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, que tal relembrarmos
desta mulher tão esquecida?
Patrícia Galvão, a Pagu (1910-62), foi
jornalista, escritora, poeta e agitadora cultural. Foi também crítica literária, de teatro e
artes visuais. Traduziu obras de autores
quase desconhecidos no Brasil, como Kafka, Valéry, Pirandello, Ionesco e
outros.
Pagu foi militante comunista, tendo
sido ferida em protestos de rua em Paris e torturada na prisão no Rio de
Janeiro.
Um fato interessante e original em sua
vida, é que ela introduziu a soja em nosso país, trazendo sementes que lhe
foram presenteadas pelo último imperador da China.
Abaixo reproduzo a elegia feita por
Carlos Drummond de Andrade por ocasião de sua morte:
Imagens
de Pedra
Carlos Drummond de Andrade
Patrícia
Galvão, musa trágica da Revolução, entre literatos... O qualificativo parece
romântico. Mas se levarmos em conta que esta mulher de grande valor e
sensibilidade entrou para o cárcere aos 25 anos de idade e dele saiu aos trinta,
pagando alto preço pelo crime exclusivo de ter ideias de justiça social quando
fascismo e nazismo pareciam na iminência de conquistar o mundo para sempre; se
soubermos que viajou à Europa e à Ásia para confrontar a coisa imaginada com a
coisa real, e esse confronto não a deixou feliz; que experimentou a condição
proletária, e conheceu a impostura dos chefes e a miséria de estrutura do
partido da revolução, sentiremos a gravidade do destino de Patrícia, a que não
faltou o definitivo desencanto, prêmio rude de quem vive uma ideia-sentimento:
sem se reconciliar com a ordem combatida recolheu-se ao “templo da decepção”,
onde a arte e a literatura oferecem consolo ao ser ofendido. Na história do modernismo, seu nome põe um
colorido dramático de insatisfação levada à luta política.
Correio da Manhã, 16 de janeiro de 1963.
Nas
vésperas de sua morte, Pagu publicou o poema “Nothing”.
Nothing
Nada
nada nada
Nada
mais do que nada
Porque
vocês querem que exista apenas o nada
Pois
existe o só nada
Um
para-brisa partido uma perna quebrada
O
nada
Fisionomias
massacradas
Tipoias
em meus amigos
Portas
arrombadas
Abertas
para o nada
Um
choro de criança
Uma
lágrima de mulher à-toa
Que
quer dizer nada
Um
quarto meio escuro
Com
um abajur quebrado
Meninas
que dançavam
Que
conversavam
Nada
Um
copo de conhaque
Um
teatro
Um
precipício
Talvez
o precipício queira dizer nada
Uma
carteirinha de travel’s check
Uma
partida for two nada
Trouxeram-me
camélias brancas e vermelhas
Uma
linda criança sorriu-me quando eu a abraçava
Um
cão rosnava na minha estrada
Um
papagaio falava coisas tão engraçadas
Pastorinhas
entraram em meu caminho
Num
samba morenamente cadenciado
Abri
o meu abraço aos amigos de sempre
Poetas
compareceram
Alguns
escritores
Gente
de teatro
Birutas
no aeroporto
E
nada.
“Nada
mais do que nada
Porque
vocês querem que exista apenas o nada
Pois
existe o só nada!
(Publicado em “A Tribuna”, Santos/SP, em 23/09/1962).
Ler
mais em: “Pagu: Vida-Obra”, Augusto de Campos, Companhia das
Letras, 2014.
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