No ano de 212 a.C., após um cerco de dois anos à cidade de Siracusa, na Magna Grécia, atual Sicília, esta foi capturada pelas legiões romanas. Quando a casa de Arquimedes – que com seus engenhos ópticos e mecânicos retardou ao máximo a queda da cidade – foi invadida pelos romanos, ele estava no quintal desenhando na areia suas figuras e estudos geométricos, quando um dos soldados pisou sobre os mesmos. Noli tangere circulos meos (não toque em meus desenhos), exclamou Arquimedes em seu precário latim, sendo imediatamente morto por uma lança, que destruiu fisicamente este velho filósofo e matemático. Mas não conseguiu eliminar o seu acervo intelectual, que, atravessando os séculos, chegou até nós.







Neste blog republicaremos também artigos da minha coluna semanal BRASILIANA, do jornal MONTBLÄAT editado por FRITZ UTZERI.




sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Amazônia: Deixa o Homem Destruir!



          Neste próximo 4 de fevereiro fazem três anos de falecimento do jornalista Fritz Utzeri e da morte de seu jornal independente Montbläat.  Como uma pequena lembrança republico este artigo, onde já denunciava a conivência criminosa deste governo com o crime organizado e a destruição ambiental, que agora culminou com a destruição total da bacia hidrográfica do Rio Doce, aniquilando com a vida e a paisagem numa área 70 mil quilômetros quadrados, afetando a vida de milhões de pessoas nos estados de Minas e Espírito Santo, bem como afetando o ambiente marinho. 
          O grave de tudo isto é que os criminosos continuam delinquindo sob as asas protetoras dos governos federal e estadual.


           O último artigo de Leonardo Boff, Ecologizar a Política é uma peça trágica dos descaminhos dos brasileiros perdidos diante de um governo que substituiu qualquer ideologia de desenvolvimento pelas cestas básicas com fins puramente eleitorais.  Boff tal qual a agulha de vitrola quebrada que arranha um velho LP na mesma faixa, produzindo um som dissonante e ininteligível, em seu artigo fala da opção preferencial pelos pobres e excluídos feita por Lula, enquanto este, cercado pelos pastores do atraso, negocia os seus apoios com o pior da sociedade brasileira.  O nosso prezado teólogo da libertação está totalmente alienado da realidade que é dominada pela falsa oposição do PSDB e PFL que têm os mesmos objetivos do PT, das falsidades ideológicas dos partidos que se dizem de esquerda e rastejam por migalhas de poder e dos demais partidos de direita com seus olhares brilhando por dinheiro sob a liderança dos pastores da ideologia da enganação.
           Quanto às esperanças ecológicas e preservacionistas de Boff no governo Lula, o tom foi dado às vésperas da eleição presidencial com o anúncio da diminuição do desmatamento da Amazônia feito pela desmoralizada Ministra Marina Silva, acompanhada por seus príncipes, aqueles representantes de ONGs irrigadas pelo dinheiro público.  Ou seja, nada será feito para salvar a Amazônia.  Apenas muita propaganda.
          No governo Lula foram devastados 84,4 mil km2 de florestas, sendo a maior devastação em um quadriênio contabilizada desde 1988 quando o desmatamento começou a ser monitorado a partir de imagens de satélites pelo INPE.  De qualquer maneira o patamar de devastação comemorado eleitoralmente pelo governo equivale a 13.137 km2, ou seja 1,5 km2 por hora ou 5 campos de futebol por minutoEm 4 anos, neste ritmo, serão devastados o equivalente a 16 milhões de campo de futebol (ver Folha de S. Paulo, 8/11/2006).  Devemos ainda considerar que para analisar o desmatamento o INPE utiliza normalmente em sua metodologia cerca de 220 imagens distribuídas por toda Amazônia, sendo que desta vez a amostra foi reduzida para 34 imagens, sendo que 14 no norte de Mato Grosso e 9 em Rondônia.  Em um vôo comercial de Cuiabá a Alta Floresta, no norte de Mato Grosso, poderemos observar durante os 800 km do percurso um contínuo de plantações de soja, milho, algodão e pastos e, portanto com poucas florestas para destruirQuem fizer uma viagem por terra de Porto Velho a Guajará-Mirim nas margens do rio Mamoré, fronteira com a Bolívia, sentirá uma angústia imensa nos seus 300 km de percurso que observará pastos degradados, balsas de mineração com suas tripulações tremendo de malária, tudo sob o testemunho das ruínas da Ferrovia Madeira-Mamoré e das meninas prostitutas abandonadas por todos e por DeusLogo nestas regiões praticamente devastadas dificilmente detectaremos alterações no meio ambiente, com o agravante de que a metodologia adotada pelo Governo brasileiro visualiza desmatamentos em terrenos acima de 20 hectaresPor outro lado os critérios da análise da destruição do meio ambiente deveriam considerar também a contaminação das águas e do solo por defensivos agrícolas e herbicidas, as atividades de caça e pesca predatória, bem como todas as afrontas ao Código Florestal.
           Para os que consideram a destruição da Amazônia como impossível diante do seu gigantismo, sendo apenas mais um blá-blá-blá, “dos que não querem deixar o homem trabalhar”, vamos comentar as transformações no norte de Mato Grosso ocorridas nos últimos anos, onde no início da década de 70, tínhamos uma densa e intocada floresta tropical povoada de tribos indígenas, algumas ainda sem contato com a nossa civilizaçãoEntre os anos de 1970 e 1973 o governo militar lança o Plano Integração Nacional (PIN) que seria uma política desenvolvimentista acompanhada de uma grande migração interna dos miseráveis do nordeste para que não sucumbissem às tentações de movimentos revolucionários e resolvesse também o problema da falta de terras para os filhos dos agricultores do centro-sul.  Mas os poucos milhares de colonos transferidos acabaram expulsos da região devido à valorização da terra com o governo dando prioridade a grandes empresas agropecuárias e de mineração.  Nesta época foi aberta a Rodovia Cuiabá-Santarém, a conhecida BR 163, pelo 9º BEC (Batalhão de Engenharia e Construção) com as terras ao seu redor sendo repassadas para testas-de-ferro particulares, e posteriormente sendo redivididas e vendidas em glebas menores conforme eram valorizadas pela abertura de estradas vicinais pelos Batalhões RodoviáriosAssim foram fundadas as cidades de SINOP, Mutum, Alta Floresta em 1978 e Juruena, Paranaíta, Matupá e outras mais em 1980.  na região de Alta Floresta um único proprietário desmatou uma área de aproximadamente 200 km x 200 km.  No site do fotógrafo Pedro Martinelli:
(www.pedromartinelli.com.br) são mostradas as fotografias da construção da BR 163, bem como a saga dos Kranhacãrore após seus primeiros contatos com os brancos em 1973 sob a responsabilidade dos sertanistas Orlando e Cláudio Villas Boas que tinham a certeza de não estar salvando os índios e sim adiando mais um pouco a sua destruição cultural e física.  Hoje nesta região temos a convivência de uma das maiores riquezas agropecuárias do mundo com um rosário de crimes ambientais que podem trazer sérias conseqüências futuras.  Não são respeitados em geral o limite para a derrubada de apenas 20% das matas nas propriedades particulares, não existe respeito na conservação das matas ciliares, nem cuidados na aplicação dos defensivos agrícolas.  Assim rios de porte como Teles Pires e o Juruena levam todo o lixo químico somados ao mercúrio das atividades de mineração, contaminado o Rio Tapajós da Bacia Amazônica.  Para o sul o rio Cuiabá contamina e assoreia o Pantanal Mato-grossense.  Para oeste o Guaporé leva a desgraça e para o leste o Xingu está na iminência de um golpe de misericórdia, pois uma pequena valorização da soja no mercado internacional fará baixar a moto-serra da destruição.  O que é impressionante é a facilidade com que se destroem até mesmo as terras protegidas.  Quando um grande “colonizador” tem interesse por uma área sob proteção, ele primeiramente se articula com os chamados representantes dos movimentos sociais que abrem trilhas e são orientados a cortar apenas as madeiras nobres como, por exemplo, o mogno (que tem a sua exploração proibida no Brasil).  Depois temos as clássicas invasões dos chamados “sem terras” que queimam tudo, fazem suas roças e providenciam a desentoca, ou seja, a retirada de tocos e raízes remanescentes.  No ato seguinte atuam neste teatro trágico os jagunços a soldo de grileiros e as terras são repassadas a grandes empresas de pecuária e finalmente após os pastos serem sucessivamente queimados, a terra está limpa para a entrada de modernas máquinas agrícolas para plantação de grãos.  Como podemos ver várias etapas deste processo só serão detectadas por imagens aéreas meses depois.  Quem tiver a oportunidade de visitar, por exemplo, a cidade de Alta Floresta, ficará impressionado com o número de serrarias e o fluxo constante de caminhões carregados de toras de madeiras, isto em uma região onde legalmente não existem mais árvores para serem cortadas.  Esta situação irá se agravar com o retorno do asfaltamento da BR 163 anunciado pelo governo no dia 5 de junho último - Dia Mundial do Meio Ambiente, quando também anunciou a criação burocrática do Parque Nacional Juruena, o terceiro maior do Brasil com 1,9 milhão de hectares, mas que infelizmente já tem sua área furada por trilhas de madeireiros como se fosse uma peneira.  Agora cabe uma pergunta, porque não existem barreiras nas estradas e rios amazônicos e uma fiscalização eficiente de toda a documentação ligada ao setor agropecuário e madeireiro?  A resposta foi dada por Lula em recente elogio a Ministra do Meio Ambiente: “Você está provando que é possível, ao invés de agente proibir, agente continuar ensinando a fazer as coisas certas neste país”.  Na realidade o governo atual não tem nenhum interesse em tocar nesta sociedade “caixa dois” que com a mesma eficiência que destrói a natureza auferindo lucros astronômicos, já negocia com Lula cargos e vantagens em função de seus resultados eleitorais frutos da enganação do povo com as falsas promessas de progresso. 
          Assistimos também a falácia das declarações de Lula após as eleições (tão saudadas por Leonardo Boff) de que governaria preferencialmente para os pobres e excluídos.  Pesquisas do Imazon (www.imazon.org.br) em 407 municípios da Amazônia mostram que o desmatamento a longo prazo piora a vida da população e que após a depredação os investidores desaparecem desmistificando o mito de que o sacrifício da natureza é o preço para o progresso.
          Esta “sociedade caixa dois” tem em seu topo os empresários desonestos acompanhados de ministros, desembargadores, políticos, líderes de ONGs desonestas, altos servidores públicos e vamos por afora.  O extrato médio é composto por pequenos empresários ligados ao crime organizado, chefes de grupos de extermínio, gatos (que fornecem mão de obra quase escrava), grileiros, os filhos ineptos do poder abrigados em ONGs e órgãos públicos etc.  A base desta sociedade é formada por todos aqueles que lutam desesperadamente para simplesmente sobreviverem!  Nela encontramos garimpeiros, mergulhadores, operadores de moto-serra, caçadores, pistoleiros de aluguel, piloteiros, motoristas e vários profissionais levados para a atividade criminosa simplesmente por ser a única opção disponível para a sua sobrevivência.  Uma pessoa analfabeta e sem nenhum conhecimento pode ganhar até R$ 800,00 mensais operando uma moto-serra em uma das “invasões sociaisonde existe pressa no abate do mogno e enquanto na baixada fluminense um pistoleiro ganha em torno de R$ 200,00 para liquidar uma pessoa comum, na Amazônia pode ganhar até dez vezes mais para liquidar um funcionário do IBAMA de nível médio ou ascender ao topo desta sociedade criminosa com o assassinato de um ser humano com a grandeza da freira Dorothy Stang em fevereiro de 2004.



Descaminhos da Amazônia, foto aérea próxima a Alta Floresta.
Foto T.Abritta, 2005.

          Portanto o processo de desmatamento está fortemente ligado ao populismo eleitoral sempre avesso a promoção social com educação e saúde pública.  Esta questão é tão preocupante que o setor da Igreja Católica progressista e não comprometido com o populismo escolheu o tema “Amazônia” para a Campanha da Fraternidade da CNBB em 2007.
  Para terminar uma pequena história infelizmente real.  Há uns oito anos viajando pelo Maranhão quando passei pela cidade de Tutóia todos me cumprimentavam efusivamente e para o meu espanto fui informado por um vereador local que me confundiam com o Prefeito da Cidade que apenas conheceram durante a última eleição e que morava em São Luís nunca mais tendo retornado a esta cidade.  Aproveitei e sugeri ao vereador uma campanha de recolhimento do lixo doméstico que era jogado nas ruas ou na porta do vizinho.  O parlamentar após coçar a cabeça disse que isto era impossível, pois em time que está ganhando não se mexe e, além disso, seria acusado de chamar o povo de porco.  Coincidentemente esta criativa frase faz parte das últimas declarações de Luiz Inácio Lula da Silva, o Supremo Mandatário da Nação!

Referências:
- Patrimônio Ambiental Brasileiro, Wagner Costa Ribeiro (organizador)
  EDUSP, São Paulo - 2003.
- Atlas de Conservação da Natureza Brasileira, Unidades Federais
  Metalivros, São Paulo – 2004.
- O Livro de Ouro da Amazônia, João Meirelles Filho
  Ediouro, Rio de Janeiro – 2004.
- Atlas Geográfico de Mato Grosso, Leodete Miranda e Lenice Amorim
  Entrelinhas, Cuiabá - 2001.
- Saudades do Brasil, Claude Lévi-Strauss
  Companhia das Letras, São Paulo – 1994.

Rio de Janeiro, 19 de novembro de 2006
Teócrito Abritta



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