No próximo dia 8 de março será
comemorado o Dia Internacional da Mulher. Este dia foi instituído pelo I Congresso Internacional da Mulher,
realizado em 1910, na Dinamarca, lembrando para sempre um terrível episódio
ocorrido em 8 de março de 1857, em Nova York, quando em uma fábrica têxtil, 129
operárias entraram em greve reivindicando redução da jornada de trabalho e um
salário igual ao dos homens. A resposta
dos patrões foi trancá-las no interior de uma das salas da fábrica, que foi
incendiada carbonizando as operárias.
Décadas depois deste massacre, milhares
de mulheres continuam sofrendo por este mundo afora, como se carregassem uma
maldição imposta por deuses impiedosos, tal nas tragédias gregas. Neste sentido o personagem mitológico
Cassandra encarna o sofrimento feminino através dos tempos.
Cassandra, por não corresponder ao amor
de Apolo, foi punida, perdendo a credibilidade de seu dom profético. Era capaz de prever o futuro, alertar os
homens das tragédias iminentes, mas nunca levada a sério. Previu a Guerra de Troia, massacres e
tiranias, sempre diante de ouvidos surdos, que não levaram a sério os seus
vaticínios da destruição desta cidade e terminou sendo levada como despojo de
guerra para Micenas, onde foi assassinada.
Portanto, o Dia Internacional da Mulher deveria ser uma oportunidade de romper
com esta verdadeira maldição que acompanha as Cassandras contemporâneas, sofrendo
em um mundo insensível e surdo aos seus lamentos e reivindicações.
Em oposição às manifestações oficiais
por esta data, onde feminismo é criticar a superexposição na mídia dos sapatos Prada das mulheres do poder, prefiro
marcar o Dia Internacional da Mulher
por um protesto-homenagem-denúncia vindo de pontos extremos de nosso
planeta, como a baixada fluminense e os contrafortes do Himalaia, na poética Darjeeling, na Índia.
Da baixada fluminense vem o terrível depoimento
de uma senhora na casa dos quarenta anos , mas com o rosto em frangalhos ,
esculpido pelo terror
de seu cotidiano.
“Andei a noite toda procurando a minha
menina , que
disseram estar zanzando por
umas bibocas pros lados
de Niterói. Encontrei ela jogada na rua , toda machucada ,
mas agradeci a Deus
por estar viva . A menina
foi castigada por andar
com os rapazes
da comunidade rival . Escapou por
ser abobalhada
(retardada ), mas
na sua amiga ,
que dava as ideias, deram uns tiros nas pernas
e tacaram fogo . Só não sofreu mais
por que
o chefe da boca
era temente
a Deus e acabou com
a farra da moçada ,
estourando os miolos da infeliz . Que Deus
proteja a sua alma !”
Da Índia, considerada por alguns um
exemplo do triunfo do capitalismo desenvolvimentista, vem um singelo sorriso
feminino que, a par de sua esperança, não deixa de mostrar a universalidade das
brutalidades contra nossas Cassandras que falam, choram ou sorriem, sempre em
um mundo de surdez (V. Figura 1).
“O trem avançava
vagarosamente, disputando os trilhos com vacas, pedestres e toda a sorte de
veículos. Na beira do caminho, farrapos
humanos trabalhavam na chuva, quase que invisíveis dentro da neblina. Quebravam e carregavam, cambaleantes, enormes
pedras. Pelas pequenas mãos machucadas e
envoltas em trapos enlameados, vi que eram mulheres realizando um trabalho
acima de sua capacidade física e em condições subumanas. Não resisti, abandonei o trem e me
aproximei. Uma das mulheres, após
descarregar suas pedras, afastou os panos encharcados que cobriam o seu rosto e
deu um lindo sorriso, mostrando uma face jovem, cortada por profundas marcas de
sofrimento, mas com grande feminilidade, exibindo adornos coloridos emoldurados
por um casaco já surrado que cobria um delicado vestido. A chuva escorria pela testa, destacando a
marca vermelha dos deuses que a abandonaram. Pensei ter perdido o trem, mas ao me voltar,
todos estavam parados, desde os maquinistas até os passageiros, calados e
consternados como se refletissem sobre aquela jovem anônima que parecia
embalada pelo Coro da Oréstia de Ésquilo que repetia: A desgraça te faz
corajosa.”
Figura 1 – A moça de Darjeeling, Índia. Foto T.Abritta, 2007.
8 de Março dia Internacional da Mulher.
ResponderExcluirAmiga(os)s sugiro o texto do Blog Teócrito Abritta.
Obrigada Téo. Lindo texto.
Vc deu alegria aquela indiana, mesmo sendo por um minuto.
Ela jamais esquecerá o momento mágico
de sua homenagem.
Só lamento, ela com quase certeza, não verá esta homenagem. Mas o mundo dá tantas voltas...
Teócrito, o seu blog está cada vez mais rico em reflexões e imagens. Que foto preciosa: a alegria escondida,aparece diante do olhar do fotógrafo. Talvez ela tenha se sentido olhada como ser humano pela primeira vez.
ResponderExcluirNeste Dia Internacional da Mulher também prefiro marcá-lo pelo protesto: "É destino de mulher/ ver morrer o prórpio filho/ e ter que ficar de pé."
Caro amigo Téo, que Feliz fotografia!
ResponderExcluirA neblina ao fundo limpa gravemente o entorno, para iluminar todos os tons e sorrisos da mulher faceira.
abrço da Lena