O papel treme nas mãos, vou lendo e
tomando conhecimento dos fatos registrados.
A versão oficial. É necessário
saber para não esquecer, para gritar.
Gritar bem alto – tamanha brutalidade.
Incomensurável injustiça.
Para continuar o texto, apenas a força
de doces sofridas palavras:
Estou triste como a árvore antiga
Cujos galhos tombaram ao temporal
O
Ocorrido:
Era para ser uma maravilhosa temporada
de férias para Pedro, vinte e quatro anos, e seus amigos que saíram do Rio em
busca do sol e cores da Bahia...
Às 13:15 horas do dia 30/07/2007, deu entrada no Instituto
Médico-Legal de Eunápolis, o corpo de uma pessoa como sendo Pedro Gomes
Ribeiro, que segundo a DELTUR, Porto Seguro-Ba, foi vítima de morte violenta
“indícios de afogamento”. Fato ocorrido
no dia 30/07/07, por volta das 02:30 horas, no Rio Caraíva, Caraíva, distrito
de Porto Seguro-Ba.
O
Laudo (resumo):
Escoriações medindo 2,5 cm de diâmetro na região sub-mentoniana. Ferida corto-contusa medindo 1,2 cm de
comprimento no couro cabeludo na região occipital (linha média). Ferida puntiforme na dobra anterior do
cotovelo direito. Equimoses e pequenas
escoriações na região peitoral.
Escoriações no cotovelo esquerdo.
Edema cerebral difuso. Fratura de
4º arco postal esquerdo em sua curvatura anterior. Pulmões edemaciados sem presença de líquido
na árvore brônquica. Presença de
equimose de +/- 2,0 cm de diâmetro no lobo superior do pulmão esquerdo.
Obs. colhido o sangue e material gástrico para exame
toxicológico – cérebro, pulmão e rins para anátomo-patológico. Pedro Gomes Ribeiro faleceu por insuficiência
respiratória aguda.
A
Sentença:
Trata-se de inquérito policial instaurado com o fim de
apurar a prática do crime previsto no artigo 121 do CP, praticado contra Pedro
Gomes Ribeiro, tendo em vista que no dia 30 de julho de 2007, por volta de
02:30 min., no rio Caraíva, no Distrito de Caraíva, Município de Porto Seguro,
o turista, que se encontrava em companhia de amigos, mergulhou no citado rio e
momentos depois foi encontrado desacordado e boiando nas águas.
A despeito das várias diligências realizadas pela
autoridade policial não foi possível identificar, até o momento, quem foi autor
deste crime, o que levou a Promotora de Justiça a requerer o arquivamento das
peças de investigação (fl. 30).
Defiro o requerimento ministerial, ordenando o arquivamento
dos autos deste Inquérito Policial ... blá, blá, blá.
Assinado juíza fulana de tal, em 20 de junho de 2008.
E assim, a douta doutora juíza,
burocraticamente sepulta a Verdade, determinando que a Justiça seja esquecida
até que apareça “um fato novo”.
O
Fato Novo:
Pedro faleceu em 30 de julho de 2007. O processo foi arquivado em menos de um ano e
o desarquivamento só foi conseguido aproximadamente três anos depois, em 2011. O “fato novo” que permitiria o prosseguimento
da ação e a punição dos culpados estava escondido no próprio processo: o laudo
anátomo-patológico simplesmente não constava dos autos, já que as autoridades
responsáveis jogaram todo o material recolhido para estes exames (ver descrição
no laudo) em um lixão. O Corregedor de
Polícia Técnica de Salvador instaurou processo administrativo para exoneração
dos envolvidos e consequente processo criminal.
Mesmo com réus confessos, a Verdade foi enterrada mais uma vez com o
arquivamento de todas as provas a pedido do Secretário de Segurança Pública da Bahia.
A
Revolta:
Desídia, má fé, prevaricação ou
associação criminosa? Os fatos mostram
grande suspeição contra autoridades do executivo e judiciário baiano.
Todo o processo está eivado de
contradições, num diz e desdiz sem fim, a par de visíveis ações para impedir a
plenitude da Verdade.
As irregularidades e má fé já se
insinuaram no traslado do corpo da Bahia para o Rio de Janeiro, sem o
acompanhamento do laudo cadavérico. A
família de Pedro teve de constituir um advogado para obter um documento que
tinha direito. A sentença da juíza está
cheia de contradições, ora fala em crime, para a seguir insinuar que Pedro
espontaneamente mergulhou no rio Caraíva, sendo poucos minutos depois encontrado
desacordado boiando nas águas. Quando
ocorreram as torturas e morte deste jovem?
Afinal a guia policial, que encaminha o corpo para perícia, fala no
envio de um corpo. Onde está a
verdade? Como uma juíza, em sintonia com
a promotora arquiva um processo com tamanhas suspeitas sem solicitarem maiores
esclarecimentos ou investigações complementares? E o escândalo, não apurado, de jogarem partes
cadavéricas em um lixão, com o claro intuito de esconderem a Verdade, sabotando
a conclusão de um laudo?
Estes fatos justificam a intervenção
do Conselho Nacional de Justiça, bem como da Procuradoria da Justiça
Federal. Justificam também uma denúncia a
ABI, OAB, ao Conselho de Justiça da OEA, e a organizações internacionais de Jornalistas.
Lembramos que Pedro era Jornalista brilhante,
mestrando na PUC- RJ, e provavelmente teve conhecimento de algum fato que
motivou tamanha violência.
Afinal, um Jornalista, mesmo de férias,
é sempre um Jornalista, sempre odiado pelos detentores deste poder medieval
ainda existente em nosso Brasil.
Quando o telefone toca, noite avançada,
madruga acesa,
meu coração dispara, relógio gritando as
horas, sirene de bombeiro.
Inevitável derrubar o telefone no chão,
perder a sensibilidade das mãos,
pisar em falso, tropeçar no cachorro, lutar
com as cobertas.
Somos quatro eternamente, três capengas e um
ausente.
Na toalha sobre a mesa, falta um prato para
sempre.
Amigos e Amigas
Conhecidos e Desconhecidos
Gritemos bem alto: Justiça!
Esta é a história, estes são os fatos.
Essa é a dor de Lúcia Gomes em sua
peregrinação contra a impunidade.
Procuro pensar que destes galhos
Caídos sobre o chão molhado
Surgirão novas mudas de mim mesma
Verdejantes e pequenas inocentes...
Verdade Verdejante.
Notas:
- O título e os fragmentos intertextuais em
itálico são versos dos poemas de Lúcia Gomes.
- Texto e fotografia por Teócrito Abritta